A Mais-valia de Karl Marx: entenda o que é e seus tipos

Anita Sayuri Aguena
Anita Sayuri Aguena
Professora de Filosofia e Sociologia

A mais-valia ou mais-valor é um dos conceitos fundamentais do pensamento filosófico de Karl Marx (1818-1883). A partir dele, Marx tenta explicar um fenômeno típico do sistema capitalista: a não remuneração do proletário pelas horas extras de trabalho.

Segundo a análise marxista, há uma desigualdade entre o valor gerado pelo trabalho de um operário e o salário que ele recebe.

Pela lógica dessa concepção, tudo o que é produzido, incluindo o esforço empregado numa jornada de trabalho completa, é materializado em produto. Tal produto possui sobre si o valor desse esforço.

O salário recebido é o custo fixo pago pela força de trabalho do operário. Em outras palavras, é o valor mínimo necessário que lhe é pago para a manutenção de sua vida e para retomada do serviço no período seguinte.

Contudo, esse custo (salário) é atingido em poucas horas de serviço (trabalho necessário), ou seja, antes do fim da jornada.

Assim, para completar essa jornada de trabalho (trabalho excedente), o trabalhador emprega uma quantidade de esforço que não lhe é convertido em valores monetários reais, mas em um valor que será apropriado pelo capitalista.

Logo, a mais-valia se refere à diferença entre o valor produzido pelo trabalho e o salário pago ao trabalhador. É, portanto, a base de exploração do sistema capitalista sobre o trabalhador.

Diferença entre mais-valia e lucro

Note que, muitas vezes, o termo mais-valia é utilizado por Marx como sinônimo de “lucro”. Contudo, eles não são sempre a mesma coisa.

Além da aproximação com a “mais-valia”, o termo “lucro” pode representar o valor resultante da venda de um produto, após o pagamento do investimento relativo aos meios de produção.

Retirado o valor investido em salários (capital variável) do valor do produto, o que resta é a mais-valia. Todavia, ela não vai para o bolso do capitalista em sua totalidade.

Parte da mais-valia serve para pagar outros investimentos (capital constante), como: insumos usados na confecção do produto, máquinas, empréstimos, impostos, etc. Todos esses investimentos fazem parte dos meios de produção. Assim, o que resta dessa conta também recebe o nome de lucro.

Resumo do sistema de mais-valia

O fenômeno de mais-valia, explicado por Marx, é baseado na exploração do sistema capitalista, em que o trabalho e o produto produzido pelos trabalhadores é transformado em mercadoria, visando o lucro do empregador. Assim, os trabalhadores acabam recebendo um valor inferior e que não condiz com o trabalho realizado.

Como exemplo, podemos pensar no seguinte: para suprir as necessidades básicas de vida (moradia, educação, saúde, alimentação, lazer, etc.) o salário de um trabalhador é atingido com o trabalho diário de 5 horas. Desta maneira, o trabalhador só necessitaria exercer sua função, numa linha de produção, durante este período.

No entanto, o sistema capitalista lhe impede de trabalhar somente cinco horas diárias. Assim, 3 horas a mais por dia (8 horas diárias), ele trabalha para suprir o que foi investido pelo empregador e a necessidade de lucro do sistema capitalista. O resultado desse sobretrabalho gratuito é a mais-valia.

Esse modelo corrobora com a exploração do trabalhador que, na maior parte das vezes, se submete a essa situação por não ter nenhuma alternativa e por não estar ciente da dimensão desse fenômeno.

Destino do Lucro

Vale lembrar que o lucro obtido pelo trabalho realizado tem como destino o patrão. Assim, o trabalhador, não tem direito sobre o produto final de seu esforço e não recebe por seu trabalho real.

De tal modo, a classe detentora dos meios de produção - a burguesia - enriquece às custas da força de trabalho proveniente da classe operária. Esse movimento leva ao aumento das desigualdades sociais.

Tipos de mais-valia

Há dois tipos de mais-valia:

  • Mais-valia absoluta: o operário sempre irá realizar o trabalho em determinado tempo que, se fosse calculado em valor monetário, resultaria na desigualdade entre o trabalho e o salário. Com a mais-valia absoluta há um aumento da intensificação do trabalho, pelo aumento de horas na jornada laboral. O lucro, aqui, é aumentado a partir da conservação dos valores empregados no trabalho necessário.
  • Mais-valia relativa: nesse caso, a mais-valia é aplicada através do uso da tecnologia, por exemplo, no aumento do número de máquinas em uma fábrica. Assim, há um aumento no ritmo de produção e no lucro. Em contrapartida, os números de trabalhadores e o salário permanecem iguais, podendo ser diminuídos.

Alienação para Marx

No contexto da mais-valia, um dos conceitos aprofundados por Marx foi o de alienação. Essa refere-se à condição do trabalhador que realiza seu trabalho, estando alheio ao que produz ou aos demais indivíduos que participam com ele da etapa de produção. Esse processo leva à desumanização do ser humano, pois ao invés de se sentir realizado com seu trabalho, ele é afastado - alienado - do que produz.

Por exemplo, numa fábrica de roupas de grife, os trabalhadores que produzem a mercadoria não possuem um salário que os permite usufruir daquele produto. Assim, segundo Marx, o trabalhador é desumanizado por esse processo, se transformando numa peça da engrenagem capitalista.

Para além do campo do trabalho, essa desumanização irá se estender para a vida do trabalhador, levando a uma desconexão consigo mesmo, com as pessoas de sua família e da realidade a sua volta.

Saiba mais sobre o assunto no artigo: Alienação na Sociologia e Filosofia.

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Referências Bibliográficas

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Anita Sayuri Aguena
Anita Sayuri Aguena
Bacharela e Licenciada em Filosofia pela Universidade Federal de São Paulo (2014), com Mestrado em História da Filosofia pela mesma universidade (2017). Atua como professora na rede privada de ensino, ministrando aulas ligadas às áreas de Filosofia e de Sociologia.