Gilberto Freyre

Juliana Bezerra
Juliana Bezerra
Professora de História

Gilberto de Mello Freyre (1900- 1987) foi um sociólogo, antropólogo, deputado e professor universitário brasileiro.

Sua obra mais conhecida é "Casa-Grande & Senzala" na qual usou novas fontes para compreender a formação do Brasil.

Biografia

Gilberto Freyre nasceu em 1900 no Recife/PE. O pai, Alfredo Freyre, era juiz e professor universitário que ensinaria latim ao filho.

Apesar do estímulo ao estudo em casa, Freyre não conseguia aprender a escrever e fazia desenhos para expressar-se. Estudou em colégios americanos e quando terminou sua formação, partiu para os Estados Unidos onde se matricularia na Universidade de Baylor, Texas e anos mais tarde, em Columbia.

Gilberto Freyre
Gilberto Freyre em sua casa em Recife

Retorna ao Brasil em 1924, assume a direção de jornais e escreve inúmeros artigos sobre a formação social do Brasil que eram publicados em jornais de Pernambuco, Rio de Janeiro e São Paulo. Igualmente, trabalha como secretário particular do governador de Pernambuco, Estácio de Albuquerque de Coimbra.

Em 1933, após intensas pesquisas, lança "Casa-Grande & Senzala", que provocaria polêmica no meio intelectual brasileiro seja por sua linguagem como pelos temas propostos.

Na década de 40 é preso e tem seu jornal empastelado por conta da oposição que fazia à ditadura de Getúlio Vargas. Em 1946, é eleito deputado pela União Democrática Nacional e segue para o Rio de Janeiro a fim de se integrar à Assembleia Constituinte.

A partir da década de 50 começa a receber convites para conferências em universidade americanas e europeias, além de formar parte de comissões da ONU que tratavam da questão racial.

Seus livros ganham edições em várias línguas e "Casa-Grande e Senzala" é a até hoje o livro de Sociologia brasileiro mais editado e traduzido no exterior.

Freyre casou-se em 1941 com Maria Magdalena Guedes Pereira com quem teve dois filhos. Em vida, conseguiu criar a Fundação Gilberto Freyre e abrir a Casa-Museu, ambos na sua antiga residência para preservar seu legado e sua biblioteca de mais de 30 mil volumes.

Recebeu vários prêmios em vida como os títulos de Doutor Honoris Causa pela Universidade Federal de Pernambuco e pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, além das universidades de Coimbra, Paris, Sussex, Münster e Oxford.

Em 1971, a Rainha Elizabeth II lhe confere o título de Sir (Cavaleiro Comandante do Império Britânico) e em 1986 foi eleito para Academia Pernambucana de Letras.

Faleceu em 1987, em Recife, em decorrência de vários problemas de saúde.

Sociologia

As principais influências de Gilberto Freyre são o antropólogo alemão Franz Boas (1858-1942), Max Weber, o poeta americano Vachel Lindsay (1879-1931), a poeta americana Amy Lowell (1874-1925), entre muitos outros. Desta maneira, ele se afasta do positivismo imperante na intelectualidade brasileira do momento.

Igualmente, incorpora à sua escrita a corrente do "Imagismo" que utiliza imagens, metáforas e símbolos para explicar suas teses.

O Expressionismo, escola pictórica que amplia ou recorta as cenas a fim de destacá-las, também foi adicionado na sua maneira de utilizar as hipérboles.

Assim, Freyre fazia afirmações duras a respeito da prostituição e da depravação dos colonizadores com as escravas, utilizando este recurso literário.

Casa-grande e Senzala
A senzala, a casa-grande e moenda de cana

Também lança mão do "numerismo" já esboçado em obras como a do escritor americano Walt Whitman (1819-1892), onde o autor vai repetindo insistentemente a mesma palavra para construir seu raciocínio.

Podemos encontrar um exemplo desta figura de linguagem no trecho onde ele explica a função da rede na Casa Grande:

Rede parada, com o senhor descansando, dormindo, cochilando, Rede andando, com o senhor em viagem ou a passeio debaixo de tapetes ou cortinas. Rede rangendo, com o senhor copulando dentro dela. Da rede não precisava afastar-se o escravocrata para dar suas ordens aos negros; mandar escrever suas cartas pelo caixeiro ou pelo capelão; jogar gamão com algum parente ou compadre. De rede viajavam quase todos — sem ânimo para montar a cavalo: deixando-se tirar de dentro de casa como geleia por uma colher.

Casa-Grande & Senzala

A obra "Casa-Grande & Senzala" foi publicada em 1933 após Freyre já ter estudado e escrito vários ensaios sobre o período colonial do Brasil.

Este livro é o primeiro de uma trilogia que se completa com "Sobrados & Mucambos", de 1936, sobre a sociedade no Brasil Império. Por último, "Ordem & Progresso", de 1957, discute a sociedade brasileira durante a República. Havia um quarto livro planejado, "Jazigos & Covas-rasas", mas as anotações foram roubadas e se perderam.

"Casa-Grande & Senzala" trouxe novas abordagens para entender a formação do Brasil. Cultura, religiosidade, culinária, hábitos de higiene, sexualidade foram alguns temas destrinchados pelo estudioso pernambucano.

Uma das teses da obra é que a mestiçagem das raças criou uma sociedade original. Através do contato de negros, índio e brancos, o brasileiro seria a síntese cultural e mestiça dessas raças. O que não quer dizer que esta formação se tenha dada de maneira pacífica, pois Freyre destaca a violência da escravidão.

Ao invés de ilustrar essa tese com dados econômicos, Freyre recorre à culinária para provar o quão mestiça era a sociedade brasileira.

“Matavam-se bois, porcos, perus. Faziam-se bolos, doces e pudins de todas as qualidades. A galinha, aliás, figura em várias cerimônias religiosas e tisanas afrodisíacas dos africanos no Brasil. O açúcar - que fez acompanhar sempre do negro - adoçou tantos aspectos da vida brasileira que não se pode separar dele a civilização nacional."

É preciso lembrar que na década de 30, o nazismo estava em plena consolidação na Alemanha. Suas ideias de pureza racial conquistavam cada vez mais adeptos em todo mundo, inclusive no Brasil. A obra "Casa-Grande & Senzala" vai defender que a mestiçagem traz mais aspectos positivos que negativos para uma nação.

Democracia racial

Gilberto Freyre foi criticado por defender a democracia racial no Brasil. Esta tese afirmava que os negros e índios não eram discriminados na sociedade brasileira.

Na verdade, essa expressão nunca foi utilizada por Freyre. Ele defendia a mestiçagem e a maneira de ser do português católico em contraponto com o protestante inglês. Esta mistura de raças será decisiva para construir uma sociedade diferente daquela existente dos países anglo-saxônicos.

A obra do sociólogo Florestan Fernandes, publicada da década de 50, desmontaria este conceito tão arraigado no pensamento brasileiro.

Frases

  • O saber deve ser como um rio, cujas águas doces, grossas, copiosas, transbordem do indivíduo, e se espraiem, estancando a sede dos outros.
  • Sem um fim social, o saber será a maior das futilidades.
  • A culinária é uma das maiores expressões do comportamento humano, do saber humano,da criatividade humana, muito do saber humano está naquilo que você come.
  • A virtude da senhora branca apoia-se em grande parte na prostituição da escrava negra;
  • Todo brasileiro traz no corpo a sombra do indígena ou do negro.
  • Nessa instituição social – a escravidão – é que encontramos na verdade o grande excitamento de sensualidade entre os portugueses, como mais tarde entre os brasileiros.
Fundação Gilberto Freyre
Aspecto da Casa-Museu Magdalena e Gilberto Freyre

Obras de Gilberto Freyre

  • Casa-Grande & Senzala, 1933
  • Guia Prático, Histórico e Sentimental da Cidade do Recife, 1934
  • Sobrados e Mucambos, 1936
  • Nordeste: Aspectos da Influência da Cana Sobre a Vida e a Paisagem, 1937
  • Assucar, 1939
  • Olinda, 1939
  • O mundo que o português criou, 1940
  • A história de um engenheiro francês no Brasil, 1941
  • Problemas brasileiros de antropologia, 1943
  • Sociologia, 1943
  • Interpretação do Brasil, 1947
  • Ingleses no Brasil, 1948
  • Ordem e Progresso, 1957
  • O Recife sim, Recife não, 1960
  • Os escravos nos anúncios de jornais brasileiros do século XIX, 1963
  • Vida social no Brasil nos meados do século XIX, 1964
  • Brasis, Brasil e Brasília, 1968
  • O brasileiro entre os outros hispanos, 1975
  • Homens, engenharias e rumos sociais, 1987

Curiosidades

  • A Escola de Samba da Mangueira, no Carnaval de fevereiro de 1962, apresentou um desfile baseado na obra “Casa-grande & Senzala”.
  • No quintal de casa, Freyre plantou grande quantidade de árvores frutíferas, especialmente a pitangueira. Do fruto, ele fazia um licor cuja receita era passada apenas para os homens da família.
  • A casa onde Gilberto Freyre viveu com sua família, no bairro de Apipucos, em Recife/PE, é a sede da Fundação Gilberto Freyre e abriga a Casa-Museu Magdalena e Gilberto Freyre.

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Juliana Bezerra
Juliana Bezerra
Bacharelada e Licenciada em História, pela PUC-RJ. Especialista em Relações Internacionais, pelo Unilasalle-RJ. Mestre em História da América Latina e União Europeia pela Universidade de Alcalá, Espanha.