Independência da Bahia (2 de julho de 1823)
Independência da Bahia (ou Independência do Brasil da Bahia) foi um movimento de resistência contra a presença militar portuguesa que, fiel à metrópole, queria manter o domínio da região no contexto da Independência do Brasil.
A vitória dos brasileiros, em 02 de julho de 1823, foi fundamental para a consolidação do processo de emancipação do Brasil.
O movimento de Independência da Bahia também costuma ser lembrado pelo protagonismo feminino na figura de Maria Quitéria, que participou ativamente dos combates.
Contexto: o processo de Independência do Brasil
Infelizmente, ainda é um erro comum reduzir a Independência do Brasil ao dia 07 de setembro de 1822, quando D. Pedro I teria dado o famoso “grito do Ipiranga”, selando a separação com a metrópole portuguesa.
Além das articulações buscadas por D. Pedro e seus aliados para garantir a base de apoio para a emancipação do Brasil, havia conflitos entre portugueses e brasileiros em várias partes do território desde 1821.
Mesmo após a Proclamação da Independência, alguns destes focos de resistência, principalmente onde havia maior número de militares portugueses, se estenderam até 1823.
Os maiores conflitos entre portugueses e brasileiros pela Independência ocorreram na Bahia, Grão-Pará, Maranhão, Piauí e Cisplatina.
Na Bahia, onde a presença militar portuguesa estava mais concentrada, foi onde a resistência durou mais tempo, se estendendo até 02 de julho de 1823.
Causas da Guerra pela Independência da Bahia
O processo de Independência do Brasil foi, de certa forma, desencadeado pela Revolução Liberal do Porto (1820). Ocorrido em Portugal, este movimento instaurou as Cortes de Lisboa e forçou a volta do rei D. João VI a Portugal, deixando seu herdeiro, D. Pedro, como regente do Brasil.
Em 1821, a Bahia enviou seus representantes às Cortes de Lisboa, onde estava sendo discutida a futura constituição do reino. Contudo, os baianos divergiam das discussões, que iam na direção de recolonizar o Brasil e não reconhecer a regência de D. Pedro, pretendendo forçar seu retorno a Portugal.
Em Salvador, o clima de agitação crescia, uma vez que a Junta Provisória de Governo da Província da Bahia (estabelecida por ordens das Cortes de Lisboa) agia de forma submissa aos interesses de Portugal. A insatisfação com o governo local crescia, provocando confrontos que envolviam militares e civis e opunham portugueses e brasileiros.
Paralelamente, crescia a pressão para o retorno de D. Pedro a Portugal, decretado pelas Cortes de Lisboa em setembro de 1821. A resposta de D. Pedro ficou conhecida como Dia do Fico, quando, em 09 de janeiro de 1822, ele jurou permanecer no Brasil.
Nesse contexto, a fim de manter o controle estratégico da Bahia, Portugal enviou um novo Governador das Armas a Salvador, o brigadeiro Inácio Luís Madeira de Melo, o que acirrou ainda mais os ânimos.
Os comandantes militares baianos se recusaram a reconhecer a autoridade de Madeira de Melo. Em resposta, no dia 19 de fevereiro de 1822, o comandante português atacou com sucesso o forte de São Pedro, principal base militar da capital baiana.
Na mesma data, ocorreu o assassinato daquela que é considerada a primeira mártir da Independência do Brasil. A abadessa Joana Angélica foi morta com golpes de baioneta por soldados portugueses que invadiram o Convento da Lapa.
A ocupação militar portuguesa em Salvador provocou o deslocamento de parte significativa da população em direção às vilas do Recôncavo, como Santo Amaro, São Francisco do Conde, Cachoeira e Maragogipe.
Em junho de 1822, fazendeiros, donos de engenhos, militares e intelectuais passaram a se articular, na região do Recôncavo, em torno da ideia de reconhecer a regência de D. Pedro e romper com Portugal.
Reunidos na Vila de Cachoeira, em 25 de junho de 1822, as lideranças baianas proclamaram o rompimento com Portugal e o reconhecimento da autoridade de D. Pedro como regente e defensor perpétuo do Brasil, movimento seguido pelas demais vilas do Recôncavo nos dias seguintes.
A reação das tropas portuguesas, comandadas pelo brigadeiro Madeira de Melo, deu início à Guerra pela Independência na Bahia.
Guerra pela Independência
Na Bahia, a Guerra pela Independência se estendeu entre 25 de junho de 1822 e 02 de julho de 1823, podendo ser dividida em duas fases.
Na primeira fase, entre junho e outubro de 1822, os combates contra as tropas portuguesas foram travados pelos chamados Batalhões Patrióticos, formados por voluntários e comandados por proprietários locais ou militares brasileiros.
Os mais conhecidos batalhões foram a Companhia dos Caçadores de Santo Amaro, os Voluntários da Vila de São Francisco e os Voluntários do Príncipe Dom Pedro.
Já na segunda fase, entre novembro de 1822 (portanto, após a Proclamação da Independência) e julho de 1823, o lado brasileiro foi liderado pelo Exército Pacificador, enviado por D. Pedro e comandado pelo general francês Pedro Labatut. Já no final dos confrontos, Labatut foi substituído pelo almirante inglês Thomas Cochrane.
Principais batalhas
Durante a Guerra pela Independência na Bahia, algumas batalhas foram cruciais para a vitória brasileira:
Batalha de Cachoeira (25 a 28 de junho de 1822): Em resposta ao rompimento de Portugal declarado na Vila de Cachoeira, o brigadeiro Madeira de Melo atacou a vila com uma embarcação armada de canhões. Com armas improvisadas, os brasileiros conseguiram tomar a embarcação e prender os marinheiros portugueses.
Batalha de Pirajá (8 de novembro de 1822): Lideradas por Labatut, as forças brasileiras derrotaram os portugueses. A batalha envolveu cerca de 4 mil homens e foi vencida pelo lado brasileiro.
Batalha de Itaparica (7 de janeiro de 1823): As forças brasileiras enfrentaram os portugueses na ilha de Itaparica. Os brasileiros obtiveram uma vitória estratégica, uma vez que a região dava acesso à Vila de Cachoeira, rota de abastecimento de alimentos para os brasileiros.
Batalha de Salvador (2 de julho de 1823): Marca o fim do movimento, com retomada de Salvador pelas tropas do Exército Pacificador comandadas pelo almirante Thomas Cochrane.
Quem foi Maria Quitéria
Considerada a grande heroína da Independência da Bahia, Maria Quitéria de Jesus entrou para a história ao se disfarçar de homem para lutar no movimento de emancipação do Brasil.
Filha de pequenos fazendeiros, Maria Quitéria fugiu de casa e, vestindo roupas masculinas, aderiu ao batalhão Voluntários do Príncipe Dom Pedro, apelidado de “Batalhão dos Periquitos”.
Acostumada a manejar armas para caçar, Maria Quitéria foi ganhando destaque nos conflitos contra os portugueses. Por isso, mesmo após sua identidade ser descoberta, ela não foi banida do batalhão. Passou então a usar um saiote sobre as calças da farda militar.
Após a vitória das forças brasileiras, sua bravura e papel nas vitórias foi reconhecida pelo imperador D. Pedro I, que lhe concedeu a medalha da Ordem do Cruzeiro.
Mesmo assim, Maria Quitéria não seguiu carreira no exército, ainda que recebesse por seus méritos um soldo (salário) de alferes por ordens do imperador. Morreu pobre e viúva, em 1853, lutando pela partilha da herança de seu pai.
Postumamente, foi reconhecida em 1996 com o título de Patronesse do Quadro Complementar de Oficiais do Exército Brasileiro.
Participação popular
Maria Quitéria não foi a única representante das camadas populares a participar do movimento de Independência da Bahia.
Nos Batalhões Patrióticos, além de soldados regulares, era grande a presença de indígenas, brancos pobres, negros libertos e escravizados, enviados pelos senhores de engenhos.
Até hoje, nas festividades em comemoração à Independência da Bahia, que acontecem anualmente no 02 de julho, a figura do caboclo aparece nos desfiles como representação do povo brasileiro.
Outra figura que vem ganhando mais atenção é a de Maria Felipa de Oliveira. Mulher preta e marisqueira, Maria Felipa é conhecida por sua participação na Batalha de Itaparica. Ela liderou um grupo de mulheres catadoras de mariscos que incendiaram os barcos portugueses, além de açoitar os soldados inimigos que tentavam desembarcar na ilha.
A memória de Maria Felipa foi preservada pela tradição oral do povo de Itaparica. Em 2018, o governo federal reconheceu a importância de Maria Felipa pela Lei nº 13.697, inscrevendo seu nome, ao lado de Maria Quitéria e Joana Angélica, no Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria.
02 de julho: a retomada de Salvador
O desfecho da Guerra de Independência na Bahia se deu em 02 de julho de 1823, quando as forças do Exército Pacificador, então comandadas pelo almirante inglês Thomas Cochrane, conseguiram retomar o controle da capital Salvador.
Somando mais de 10 mil homens, o Exército Pacificador conseguiu forçar a rendição dos militares portugueses, que contavam com menos da metade deste contingente e, cercados, estavam sofrendo com a falta de alimentos.
As forças brasileiras desfilaram pelas ruas de Salvador, sendo festejadas pelos cidadãos brasileiros que permaneceram na cidade durante a ocupação portuguesa.
Até hoje, 02 de julho é a maior data de celebração da Independência para os baianos, sendo comemorada em desfiles em diversas cidades e feriado no Estado da Bahia.
Importância para a Independência do Brasil
A vitória dos brasileiros na Bahia foi fundamental para a consolidação do processo de Independência do Brasil.
O movimento demonstrou a capacidade de enfrentamento e resistência por parte do Brasil, desestimulando novas tentativas de retomada militar do antigo território colonial pelos portugueses.
Leia também:
- Independência do Brasil - 7 de setembro: resumo do processo
- Dia do Fico: 9 de janeiro de 1822
- Maria Quitéria
Referências Bibliográficas
FAUSTO, Boris. História do Brasil. 2ª edição. São Paulo: Edusp, 1995.
SCHWARCZ, Lilia Moritz; STARLING, Heloisa Murgel. Brasil: uma biografia. São Paulo: Companhia das Letras, 2015.
TAVARES, Luís Henrique Dias. História da Bahia. 12ª edição. São Paulo: Editora UNESP, 2020.
CASTRO, Ligia. Independência da Bahia (2 de julho de 1823). Toda Matéria, [s.d.]. Disponível em: https://www.todamateria.com.br/independencia-da-bahia/. Acesso em: