Povos indígenas do Brasil: principais etnias, suas culturas e histórias

Ligia Lemos de Castro
Revisão por Ligia Lemos de Castro
Professora de História

Os povos indígenas brasileiros formam hoje um contingente que representa cerca de 0,83% da população brasileira.

Segundo os dados do último Censo do IBGE (2022), há 1.693.535 indígenas no país, sendo que desse total 622,1 mil (36,73%) vivem em terras indígenas oficialmente reconhecidas pelo governo federal e 1,1 milhão (63,27%) fora delas.

Os povos indígenas estão presentes em todo território brasileiro, tanto em áreas urbanas quanto rurais. A região norte é a que possui a maior população indígena do país (44,48%).

Mapa com a distribuição da população indígena no Brasil

Etnias indígenas no Brasil

No Censo anterior (2010), o IBGE havia identificado 305 grupos étnicos indígenas no Brasil, falantes de 274 diferentes línguas. Dentre eles, há dois troncos principais:

  • Macro-Jê: que incluem os grupos Boróro, Guató, Jê, Karajá, Krenák, Maxakali, Ofayé, Rikbaktsa e Yatê.
  • Tupi: onde estão os Arikém, Awetí, Jurúna, Mawé, Mondé, Mundurukú, Puroborá, Ramaráma, Tuparí e Tupi-Guarani.

Segundo dados do Instituto Socioambiental (ISA), as etnias que se destacam pelo número de habitantes (números do Censo 2010) são:

  • Guarani: originários do tronco da família linguística tupi, os guaranis habitam diversos estados do Brasil e estão divididos em três grupos: kaiowá, mbya e ñadevaesse.
  • Ticuna: pertencente à família linguística ticuna, estão localizados na Amazônia, sobretudo às margens do rio Solimões. Eles são considerados o maior grupo indígena que vive na região.
  • Caingangue: proveniente do tronco da família linguística macro-jê, os caingangues se concentram em quatro estados do Brasil: São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
  • Macuxi: da família linguística Karib, os macuxis encontram-se, na maioria, no estado de Roraima, vivendo majoritariamente em aldeias e pequenas habitações isoladas pelo estado.
  • Guajajara: oriundos do tronco tupi, os guajajaras existentes moram no estado do Maranhão.
  • Terena: da família linguística aruak, encontram-se nos estados do Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e São Paulo.
  • Yanomami: da família linguística yanomami, esse grupo habita os estados do Amazonas e Roraima.
  • Xavante: originários do tronco da família linguística macro-jê, os xavantes estão concentrados em reservas indígenas no estado do Mato Grosso.
  • Potiguara: pertencem ao tronco da família linguística tupi e estão concentrados nos estados da Paraíba, Ceará, Pernambuco e Rio Grande do Norte.
  • Pataxó: da família linguística pataxó, esse grupo encontra-se nos estados da Bahia e Minas Gerais.

Estude mais sobre o povo indígena Yanomami.

Culturas indígenas

As culturas indígenas são diversas , e cada etnia tem seus hábitos próprios e um jeito de se relacionar com o mundo. Ainda assim, podemos identificar que muitos povos compartilham modos de vida, rituais e organização social semelhantes

índios pataxós
Imagem dos índios pataxós

Línguas indígenas

Atualmente, existem 274 línguas indígenas identificadas no Brasil, segundo o censo do IBGE de 2010.

Os estudiosos organizam esses idiomas em dois grandes troncos linguísticos: Tupi e Macro-Jê. Dizer que esses idiomas fazem parte do mesmo tronco, isto é, de uma mesma origem, não significa afirmar que são parecidos.

Para que você entenda melhor: o português e o francês fazem parte do mesmo tronco linguístico, o latim, e são bastante diferentes entre si.

Além disso, dentro dos troncos linguísticos há a classificação por famílias, como Karib, Aruak, Tukano, etc., que podem conter mais de um idioma cada. Fora as línguas dos povos indígenas isolados, que ainda não tiveram contato com as sociedades não-indígenas.

A oralidade é algo notório nas comunidades indígenas, sendo que grande parte da cultura é transmitida desta maneira. Todavia, cada vez mais os povos indígenas têm buscado a escrita como forma de registrar sua cultura. Assim, é crescente a produção de escritores de origem indígena.

Organização social nas sociedades indígenas

Os povos indígenas que vivem nas comunidades tradicionais formam aldeias, que é um conjunto de habitações organizadas de acordo com a cultura de cada povo. Essas aldeias podem ser classificadas pelo formato: circulares, retangulares, lineares, entre outros. O pátio das aldeias é o lugar onde ocorrem as celebrações e rituais, onde a vida comunitária acontece.

As casas também são construídas de acordo com a tradição de cada povo, respeitando sua religiosidade, a estrutura social, entre outros fatores. São utilizados materiais da floresta, como a madeira e a palha, e os métodos de construção, durabilidade, formato e tamanho são diversos entre si.

Não podemos esquecer que muitos indígenas vivem hoje no Brasil em áreas urbanas, habitando aldeias ou não. Um exemplo são as aldeias indígenas Guarani localizadas da Terra Indígena Jaraguá, no município de São Paulo, maior cidade do Brasil.

Parque indígena do xingu
Parque do Xingu no estado de Mato Grosso, local que abriga diversas etnias indígenas.

Nas comunidades indígenas tradicionais a divisão de tarefas é muito clara, de modo que os papéis sociais e tarefas de homens e mulheres são bem demarcados, buscando um equilíbrio.

Nesse sentido, a casa e a alimentação, incluindo o plantio e preparo dos alimentos, são tarefas femininas, bem como o cuidado das crianças e a produção de utensílios. Cabe aos homens a caça, a defesa do território, as construções e as decisões políticas.

Os rituais de casamento são muito diversos de acordo com cada etnia mas, em geral, nas sociedades indígenas tradicionais as uniões são resultados de acordos entre as famílias buscando a manutenção da comunidade.

Religiões dos povos indígenas

A religiosidade dos povos indígenas não se separa de todo seu modo de viver. Como vimos, até a construção das casas obedece a uma determinada maneira de crer.

Em geral, os povos indígenas acreditam em divindades que se ligam a elementos da natureza, animados por espíritos criadores de tudo que existe. Estas divindades são cultuadas por meio de rituais, que envolvem cantos, danças, práticas alimentares e pinturas corporais que, como sempre, variam de povo a povo.

Também são bastante presentes os chamados ritos de passagem, que demarcam a saída da infância para a vida adulta e são diferentes para homens e mulheres.

Nas comunidades indígenas tradicionais é marcante a presença de uma liderança religiosa. Em tupi, essa liderança é chamada de pajé, mas há outros nomes dependendo da língua. Seu papel é fazer a intermediação entre a comunidade e o sagrado, aconselhando e realizando a cura. Isto porque este líder é considerado um sábio conhecedor das plantas e rituais, sendo capaz de se comunicar com os ancestrais.

Arte indígena

A arte indígena é extremamente rica e se manifesta na música, dança, arte plumária, cestaria, cerâmica, tecelagem e pintura corporal.

O uso das cores e de certos materiais estão relacionados aos ritos de passagem, celebrações agrícolas e do cotidiano.

Imagem das bonecas Karajá. Foram declaradas patrimônio imaterial pelo IPHAN.
Imagem das bonecas Karajá. Foram declaradas patrimônio imaterial pelo IPHAN (Fonte: Kely Carvalho, CC BY-NC-SA 2.0 DEED)

A relação entre os portugueses e os indígenas brasileiros

Estima-se que em 1500 havia cerca de 5 milhões de pessoas habitando o atual território do Brasil.

Quando os portugueses chegaram ao Brasil, encontraram uma população que habitava o litoral. Estes povos encontrados por Cabral na Bahia, os Tupinambás e Tupiniquins, pertenciam ao grupo linguístico tupi.

Os europeus passaram a nomear essas pessoas como “índios”, resultado do equívoco inicial de pensar estarem em territórios orientais (as Índias), e não em um continente desconhecido. Contudo, o termo se manteve como marca de distinção social entre colonizadores e colonizados, colocando os povos nativos sempre em posição de inferioridade.

Atualmente o uso do termo genérico índio, que apaga a diversidade cultural entre as etnias, costuma ser evitado.

Num primeiro momento, os contatos entre os indígenas e brancos foram razoavelmente cordiais e marcados pelo escambo, ou seja, a troca de produtos.

O trabalho de derrubar o pau-brasil e preparar a madeira para embarque era feito pelos indígenas, em troca de roupas, colares, espelhos, facas, serras e machados.

Os portugueses também se valeram dos conhecimentos desses povos para explorar a terra, como o plantio de mandioca e outros vegetais, a descobertas de caminhos para adentrar o território, entre outros.

Quando o português implantou um sistema colonial baseado na lavoura de produtos valorizados na Europa, como o açúcar, e pretendeu transformar os povos originários em escravizados, segregou-os nos engenhos e privou-os da caça e da pesca e instigou as lutas seculares entre os povos inimigos.

Os portugueses também buscaram impor sua religião, o cristianismo, às populações indígenas. A ordem dos jesuítas estabeleceu missões com a tarefa de catequizar essas populações, cujos costumes consideravam selvagens.

Assim, instalou-se uma guerra entre brancos e os povos nativos. Tais conflitos se estenderam ao longo de todo período colonial e depois dele.

Escravidão indígena Debret
Índios soldados da província de Curitiba escoltando prisioneiros nativos, de Jean-Baptiste Debret

As populações indígenas perderam suas terras e sofreram um aniquilamento progressivo.

A capitania de São Vicente (São Paulo), nos séculos XVI e XVII, foi o maior exemplo disso. De lá partiram as Bandeiras de caça aos povos originários, que promoviam verdadeiras guerras de extermínio.

Família de um chefe indígena Camacan preparando-se para um Festival, de Jean-Baptiste Debret
Família de um chefe indígena Camacã preparando-se para um festival, de Jean-Baptiste Debret

A antropofagia entre os povos indígenas

Sem dúvidas, a antropofagia foi uma das práticas culturais dos povos originários que mais chocaram os europeus. Era praticada pelos Tupinambás, entre outros povos.

Quando os indígenas necessitavam de novos campos de caça, em virtude da escassez de animais, ou quando desejavam terras mais férteis, valiam-se da guerra. Desenvolvia-se assim, geração após geração, um ideal guerreiro de masculinidade, coragem e força.

A antropofagia entre os povos originários não era provocada pela ausência de alimentos. Eles devoravam seus semelhantes por dois motivos: vingança e culto aos antepassados.

Em algumas comunidades devoravam-se também os próprios membros do grupo que faleciam de morte natural. Acreditavam que, desta forma, assimilavam as virtudes do parente falecido.

Nações indígenas na época colonial

Desde a época colonial houve interesse em conhecer os indígenas, a fim de torná-los aliados contra invasões de outros europeus.

Vale lembrar que a visão formada pelos portugueses era bastante influenciada pelos povos de origem Tupi, primeiros a ter contato com os europeus.

Assim, a primeira forma para entender os indígenas foi reuni-los em grupos linguísticos ou grandes nações, das quais se destacaram:

  • Tupi: espalhavam-se por toda a costa atlântica e várias áreas do interior;
  • ou Tapuia: viviam no Planalto Central brasileiro;
  • Aruak: habitavam, na maioria, na Bacia Amazônica;
  • Karib: ocupavam o norte da Bacia Amazônica.

Mapa dos povos indígenas na época dos descobrimentos

Herança cultural indígena

As culturas indígenas são uma das matrizes formadoras da sociedade brasileira. Dentre os costumes herdados dos indígenas destacam-se:

  • O uso da rede de dormir;
  • A utilização do milho, da mandioca, do guaraná e demais frutos nativos;
  • O emprego de várias ervas medicinais;
  • As técnicas de fabricação de canoas, jangadas e artefatos de palha e cipó;
  • O uso de técnicas agrícolas tradicionais como a coivara (queimada das roças antes de fazer novo plantio), etc.

A língua portuguesa falada em nosso país possui uma infinidade de palavras de origem indígena, como Iara, Jaci, Itu, Itapetininga, Anhanguera, tapioca, beiju, pamonha, gamela, puçá, arapuca, dentre outras.

Na sociedade colonial, a união entre indígenas e brancos - no princípio considerada ilegítima - ganhou o nome de "mameluco" ou "caboclo". Por sua vez, a união entre indígenas e negros deu origem aos termos "cafuzo" e "caboré".

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Referências Bibliográficas

BRASIL. Censo Demográfico 2022: indígenas, primeiros resultados do universo. Rio de Janeiro: IBGE, 2023.

JECUPÉ, Kaká Werá. A terra dos mil povos: história indígena brasileira contada por um índio. São Paulo: Peirópolis, 1998.

MUNDURUKU, Daniel. Coisas de índio. São Paulo: Callis, 2000,

PAPPIANI, Angela. Povo verdadeiro: os povos indígenas no Brasil. São Paulo: Ikorê, 2009.

Ligia Lemos de Castro
Revisão por Ligia Lemos de Castro
Professora de História formada pela Universidade Federal de São Paulo. Especialista em Docência na Educação à Distância pela Universidade Federal de São Carlos. Leciona História para turmas do Ensino Fundamental II desde 2017.
Juliana Bezerra
Edição por Juliana Bezerra
Bacharelada e Licenciada em História, pela PUC-RJ. Especialista em Relações Internacionais, pelo Unilasalle-RJ. Mestre em História da América Latina e União Europeia pela Universidade de Alcalá, Espanha.