Prosa Gótica

Daniela Diana
Daniela Diana
Professora licenciada em Letras

A Prosa Gótica é um estilo literário que foi criado no Romantismo (século XVIII) e até hoje muitos escritores fazem parte dessa corrente.

Lembre-se que a prosa, diferente da poesia, é um tipo de texto natural (e não em versos), denominado de linguagem corrida.

Romantismo no Brasil

O romantismo representa uma escola artística e literária que surgiu no século XVIII. No Brasil ele é marcado pela chegada da família real, no início do século XIX.

O romantismo no Brasil, influenciado pela Revolução francesa e a Independência dos Estados Unidos, está dividido em três períodos, os quais apresentam características peculiares.

Assim, a primeira geração romântica explorou temas nacionalistas e ufanistas, visto que em 1822 ocorria a independência do país.

Nesse contexto, os autores buscavam apresentar a nação brasileira de maneira idealizada, tal qual na corrente indianista, donde o indígena é eleito o herói nacional.

Dessa fase, os autores que merecem destaque: Gonçalves Dias, Gonçalves de Magalhães e José de Alencar.

Na segunda geração do romantismo, denominada de “mal do século” ou “geração ultrarromântica”, os autores produziam textos literários carregados de pessimismo, negativismo. Exploravam temas como a morte, a angústia, o fatalismo, as desilusões amorosas, dentre outros.

Nesse momento, surge a prosa gótica. Considerada um estilo marginal, merecem destaque os escritores brasileiros influenciados pelas obras do poeta inglês romântico Lord Byron (1788-1824): Álvares de Azevedo e Bernardo Guimarães.

Na terceira fase do romantismo no Brasil, chamada de “Geração Condoreira”, o foco é modificado para a escolha de temas relacionados à liberdade e aos temas sociais. Nesse período, os escritores mais relevantes foram Castro Alves, Tobias Barreto e Sousândrade.

Observe que a prosa romântica no Brasil foi marcada segundo os estilos de textos, donde se destacou a prosa gótica, prosa indianista, prosa urbana e prosa regionalista.

Características da Prosa Gótica

Segue abaixo as principais características da prosa gótica:

  • Temas misteriosos, ocultistas e obscuros
  • Oposição ao racionalismo e materialismo
  • Literatura fantasiosa
  • Pessimismo, negativismo e fuga da realidade
  • Ambiente noturno, sobrenatural e satânico

Literatura Gótica

A literatura gótica surge no século XVIII, mais precisamente na Inglaterra, com a publicação de “O Castelo de Otranto” (1764). Essa obra tem a autoria do romancista inglês Horace Walpole (1717-1797).

Uma das principais características dos romances de estilo gótico é a exploração de personagens melodramáticas. O enredo é cheio de mistérios, terror e cenários noturnos e sobrenaturais.

A prosa gótica inglesa também foi explorada por Oscar Wilde (1854-1900), um dos dramaturgos e escritores mais importantes da Inglaterra.

De suas obras em estilo gótico temos: o romance “O Retrato de Dorian Gray” e a novela “O Fantasma de Canterville”.

Nos Estados Unidos, Edgar Allan Poe (1809-1849) foi, sem dúvida, o maior escritor que explorou a estilo gótico, fazendo parte do movimento denominado “Romantismo Sombrio”.

De sua obra, permeada de horror e mistério, destacam-se "A Narrativa de Arthur Gordon Pym", "O Gato Preto", "O Corvo", "A Queda da Casa de Usher", "Os Assassinatos da Rua Morgue" e "A Máscara da Morte Rubra".

Na França, o poeta simbolista Charles Baudelaire (1821-1867) explorou o estilo gótico nas obras: "As Flores do Mal", "Os Paraísos Artificiais"; "Miudezas".

Poesia Gótica

Além da prosa, a poesia gótica foi também muito explorada na literatura gótica. Lord Byron (1788-1824) foi um dos poetas mais importantes do romantismo inglês, dentre suas obras de estilo gótico temos: "Horas de Lazer", "Escuridão", "O Sonho", "A Profecia de Dante", "Manfred" e "Don Juan".

Na poesia do escritor inglês Oscar Wilde, destacam-se as obras: "Rosa Mystica" e "Flores de Ouro".

No Brasil, além de Álvares de Azevedo, com a obra poética “Lira dos Vinte Anos”, Augusto dos Anjos (1884-1914) explorou o estilo gótico em suas obras "Saudade e Versos Íntimos", "Psicologia de um Vencido", "Ao Luar" e "Eu e Outras Poesias".

Exemplo de Poesia Gótica no Brasil

Para entender melhor a linguagem explorada pela poesia gótica, segue um trecho do Poema “Monólogo de Uma Sombra” do escritor brasileiro Augusto dos Anjos:

“Sou uma Sombra! Venho de outras eras,
Do cosmopolitismo das moneras...
Pólipo de recônditas reentrâncias,
Larva de caos telúrico, procedo
Da escuridão do cósmico segredo,
Da substância de todas as substâncias!
A simbiose das coisas me equilibra.
Em minha ignota mônada, ampla, vibra
A alma dos movimentos rotatórios...
E é de mim que decorrem, simultâneas,
A saúde das forças subterrâneas
E a morbidez dos seres ilusórios!”

Exemplos de Prosa Gótica no Brasil

Quando pensamos no estilo gótico na literatura romântica, pensamos logo em Álvares de Azevedo. Foi ele quem introduziu o estilo no Brasil com as obras “Noite na Taverna” e “Macário”.

Noite na Taverna

Noite na Taverna, de Álvares de Azevedo, foi publicada postumamente em 1855. A obra de dois volumes e sete capítulos representa uma série de narrativas de dimensões fantásticas, desenvolvidas numa taverna em torno dos temas do amor, sexo e morte. Segue abaixo um trecho da obra:

— Silêncio, moços! acabai com essas cantilenas horríveis! Não vedes que as mulheres dormem ébrias, macilentas como defuntos? Não sentis que o sono da embriaguez pesa negro naquelas pálpebras onde a beleza sigilou os olhares da volúpia?

— Cala-te, Johann! enquanto as mulheres dormem e Arnold — o louro, cambaleia e adormece murmurando as canções de orgia de Tieck, que música mais bela que o alarido da saturnal? Quando as nuvens correm negras no céu como um bando de corvos errantes, e a lua desmaia como a luz de uma lâmpada sobre a alvura de uma beleza que dorme, que melhor noite que a passada ao reflexo das taças?

— És um louco, Bertram! não é a lua que lá vai macilenta: e o relâmpago que passa e ri de escárnio as agonias do povo que morre... aos soluços que seguem as mortalhas do cólera!

— O cólera! e que importa? Não há por ora vida bastante nas veias do homem? não borbulha a febre ainda as ondas do vinho? não reluz em todo o seu fogo a lâmpada da vida na lanterna do crânio?

— Vinho! vinho! Não vês que as taças estão vazias bebemos o vácuo, como um sonâmbulo?

— É o Fichtismo na embriaguez! Espiritualista, bebe a imaterialidade da embriaguez!

— Oh! vazio! meu copo esta vazio! Olá taverneira, não vês que as garrafas estão esgotadas? Não sabes, desgraçada, que os lábios da garrafa são como os da mulher: só valem beijos enquanto o fogo do vinho ou o fogo do amor os borrifa de lava?

— O vinho acabou-se nos copos, Bertram, mas o fumo ondula ainda nos cachimbos! Após os vapores do vinho os vapores da fumaça! Senhores, em nome de todas as nossas reminiscências, de todos os nossos sonhos que mentiram, de todas as nossas esperanças que desbotaram, uma última saúde! A taverneira ai nos trouxe mais vinho: uma saúde! O fumo e a imagem do idealismo, e o transunto de tudo quanto ha mais vaporoso naquele espiritualismo que nos fala da imortalidade da alma! E pois, ao fumo das Antilhas, a imortalidade da alma!

— Bravo! bravo!

Macário

Dividido em dois episódios, a peça teatral escrita por Álvares de Azevedo em 1855 aborda a história do estudante Macário. Este é o nome do protagonista da história, o qual tem um encontro com Satã.

Segue abaixo um trecho da obra:

Não escreverei mais: não. Calarei o meu segredo e morrerei com ele.

Esqueceu tudo! tudo! Esqueceu as noites solitárias em que eu estava a sós com ela, com sua mão na minha, com seus olhos nos meus. Esqueceu! Deus lhe perdoe. E se eu morro por ela, seja ela feliz! Mas por que mentia se ela se ria de mim? Por que aqueles olhares tão lânguidos, aqueles suspiros tão doces? Por que sua mão estremecia nas minhas e se gelava quando eu a apertava? Por que naquela noite fatal, quando eu a beijei, ela escondeu seu rosto de virgem nas mãos, c as lágrimas corriam por entre seus dedos, e ela fugiu soluçando ? ( Pensativo ) .

Ela não me ama...é certo. Nunca, nunca ela me teve amor: a ilusão morreu... Oh! não morrerei com ela? Ontem falei com Davi sobre o suicídio. Davi declamou, repetiu o que dizem esses homens sem irritabilidade de coração, que julgam que as palavras provam alguma coisa. Eu sorri. Davi é feliz: ele sim, nunca amará, não há de sentir esse sentimento único e queimador absorver como uma casuarina toda a seiva do peito, alimentar-se de todas as esperanças, todas as ambições, todos os amores da terra e do céu, dos homens e de Deus, para fazer de tudo isso uma única essência, para transubstanciar tudo isso no amor de uma mulher! E depois, quando esse amor morrer, achando o peito vazio como o de um esqueleto, não terá animo para adormecer no seio da morte!

Eis aí o veneno, ó minha terra! Ó minha mãe! mais nunca te verei! Meu pai, meu santo pai! e tu, mãe'! de minha mãe que sentias por mim, cuja vida era uma oração por mim, que enxugavas tuas lágrimas nos teus cabelos brancos pensando no teu pobre neto! Adeus! Perdão! perdão!

Creio que chorei. Tenho a face molhada. A dor me enfraqueceria? Não! não Não há remédio. Morrerei.”

Leia também:

Edgar Allan Poe

Prosa Romântica no Brasil

Daniela Diana
Daniela Diana
Licenciada em Letras pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) em 2008 e Bacharelada em Produção Cultural pela Universidade Federal Fluminense (UFF) em 2014. Amante das letras, artes e culturas, desde 2012 trabalha com produção e gestão de conteúdos on-line.